pão por Deus
Dia 1 de Novembro. Foi em Mafra. Um costume que desconhecia. Pelas ruas da vila, crianças, de saco de pano na mão, tocavam as campainhas das portas, entravam nos estabelecimentos comerciais e gritavam: "Pão por Deus!". As portas abriam-se, os donos dos estabelecimentos sorriam e os sacos dos miúdos iam-se enchendo de rebuçados, doces, fruta e... chouriços...
Do "Boletim da Juventude" da Câmara Municipal de Mafra, do ano passado, assinado por Carla Nascimento Ribeiro, retirei este excerto:
"Sair para a rua com um grupo de amigos, se bem que com os pais atrás, levando nas mãos apenas um saco de pão e tendo autorização para carregar em quase todas as campainhas das portas, não podia ser mais convidativo. Com um percurso já testado do ano passado e com a benção do sol, foram vencidos os primeiros acanhamentos iniciais e o peditório começou!
Quase todas as casas abriram as suas portas. De roupão e toalha à cabeça, de pijama ou já com a toilette vestida, as gentes de Mafra sorriram para dúzias de crianças que pediam a bons pulmões: "Pão por Deus!" E dizendo isto levantavam os sacos do pão abertos, deitavam um olhar de esguelha aos donativos e apressavam-se a correr para a casa seguinte. É claro que para os pais ficava a tarefa dos agradecimentos. Nem uma única vez a reacção foi rabugenta, malcriada ou zangada. Sempre com um sorriso, os donos das casas ou corriam para a cozinha a buscar umas quantas guloseimas ou então, e daqui já se vê onde reside o espírito desta tradição, simplesmente pegavam em saquinhos já feitos e atados e depositavam dentro dos sacos do pão.
O costume da esmola do dia de finados, que em muitas zonas da Estremadura assume o nome de "Pão por Deus", é na verdade uma tradição com muitos anos de história vivida não apenas em Portugal, mas também noutros países da Europa. Se no início esta prática estava associada a "sacrifícios ou cerimónias fúnebres rituais (...) que consistiam em ofertas alimentares às almas dos familiares falecidos" (Boletim Cultural Mafra/92), com o passar do tempo o peditório começou a ser feito pelos mendigos e pelas crianças pobres ou não. Estes "representavam as almas dos mortos que nessa ocasião também erravam pelo mundo a visitar os lugares que em vida tinham habitado". Na zona de Torres Vedras, por exemplo, há 50 anos atrás os donativos consistiam em "broas de erva-doce, nozes, pinhões, figos secos, passas, peros e maçãs" (Festividades cíclicas em Portugal de Ernesto Veiga de Oliveira/1984). E hoje?..."
Hoje, eu próprio confirmei: Os sorrisos das crianças que estendiam os sacos abertos eram os mesmos sorrisos de quem oferecia guloseimas, fruta, doces.. e até dinheiro, quando não tinham outra coisa...
Tradição de há quantos anos?... Não sei! Como dizia a D.Nazaré Cachucho, a viver em Mafra, há mais de 40 anos: "Eu adoro o Pão por Deus, de ver as crianças da rua e desconhecidas. A primeira criança tocou-me à campainha às 8 horas da manhã e as últimas apareceram por volta do meio-dia."
5 Comentários:
Tradição que conheço, mas a que há muito não assisto.
Terá alguma coisa a ver com um costume semelhante do outro lado do mar... o Halloween?
Um beijo, Amaral.
Tradições maravilhosas, que não se devem perder. Beijos.
uma tradição que nao conhecia.
Ando sem tempo e a fugir
Mas vim desejar-te
Um dia a sorrir...
Beijos e bom fim de semana
Que bom!
Beijo,
Jo
na Madeira também existe essa tradição...aqui geralmente é oferecido fruta,as nozes e castanhas não podem faltar:). Durante alguns anos não estive na Madeira nesse dia mas os meus pais e amigos tinham por hábito enviarem por correio o meu pão por deus:)É bom manter as tradições...beijos
<< Home