fiozinho de água
Desci a ponte de pedra e esqueci-a depressa, no chiar dos passos sobre a erva ressequida pelo calor do sol da tarde que começava.
Tinha ainda tempo de chegar lá acima, e contava voltar antes que se fizesse tarde e, em casa, não dessem pela minha falta.
A escola deixara-me uma hora livre e eu senti que era o dia indicado para subir aquela serra.
Subir a serra! Nunca vira tantos eucaliptos, tantos troncos partidos, tantas subidas íngremes, mata tão densa que obrigava a procurar cuidadosamente onde pôr os pés.
Corria quando podia. Subia quanto podia. Parava, por vezes, ofegante.
Várias vezes olhava para cima, à procura da rua empedrada que dava acesso ao caminho para a igrejinha. Sabia que ela estava lá no alto, porque a vira quando participara na procissão de Agosto. Naquela em que prometera ali voltar, sozinho, para descobrir o segredo que, até então, lhe haviam escondido.
Sentia os pés doridos, os joelhos arranhados, as mãos já ásperas de tanto agarrar nas folhas e nos troncos partidos. Mas o desejo de chegar lá acima era superior ao esforço que sabia ser necessário. Quantas vezes pensara nisso mesmo! Quantas vezes desistira da ideia! Quantos dias demorara a decidir! Quanta ansiedade, quanta alegria esperava viver!
Os pais sempre o demoveram de chegar àquele sítio. Porque era perigoso, porque ficava longe, porque nada tinha de especial, porque não havia nem estrada, nem acesso possível... Mas eu sabia que o Tio Joaquim falava verdade, quando me falava do sítio maravilhoso que estava escondido na serra.
O Sol escondeu-se numa nuvem que passava. Deixara a mata, subia agora um monte de pedras ponteagudas, desci e subi, pisei uma erva verde como nunca vira, senti os sapatos molhados e dei por mim a gatinhar para alcançar o que me pareceu ser a entrada duma gruta.
Não era uma gruta. Pus-me de joelhos, agarrado a duas rochas ainhadas uma na outra, como dois peitos de mulher.
A luz do Sol entrava por entre a ramagem e iluminava aquele recanto com todas as cores do arco-iris. Pensei que havia chegado ao céu. A um metro de mim, um coelho olhava-me com olhos assustados e parara de beber, quando deu pela minha presença. Sem saber como nem porquê, senti-me rodeado pelo murmurar doce dum riacho, pelo chilrear dos pássaros no cimo das árvores, pelo pêlo luzidio do coelho, pelo macio da erva humedecida, pela luz que vinha do céu e me enchia a cara, as mãos, as pernas...
Por momentos, fiquei sem saber quem era eu: se o Sol, se o coelho, se aquele fiozinho de água que nascia daquela pedra brilhante...
Tinha ainda tempo de chegar lá acima, e contava voltar antes que se fizesse tarde e, em casa, não dessem pela minha falta.
A escola deixara-me uma hora livre e eu senti que era o dia indicado para subir aquela serra.
Subir a serra! Nunca vira tantos eucaliptos, tantos troncos partidos, tantas subidas íngremes, mata tão densa que obrigava a procurar cuidadosamente onde pôr os pés.
Corria quando podia. Subia quanto podia. Parava, por vezes, ofegante.
Várias vezes olhava para cima, à procura da rua empedrada que dava acesso ao caminho para a igrejinha. Sabia que ela estava lá no alto, porque a vira quando participara na procissão de Agosto. Naquela em que prometera ali voltar, sozinho, para descobrir o segredo que, até então, lhe haviam escondido.
Sentia os pés doridos, os joelhos arranhados, as mãos já ásperas de tanto agarrar nas folhas e nos troncos partidos. Mas o desejo de chegar lá acima era superior ao esforço que sabia ser necessário. Quantas vezes pensara nisso mesmo! Quantas vezes desistira da ideia! Quantos dias demorara a decidir! Quanta ansiedade, quanta alegria esperava viver!
Os pais sempre o demoveram de chegar àquele sítio. Porque era perigoso, porque ficava longe, porque nada tinha de especial, porque não havia nem estrada, nem acesso possível... Mas eu sabia que o Tio Joaquim falava verdade, quando me falava do sítio maravilhoso que estava escondido na serra.
O Sol escondeu-se numa nuvem que passava. Deixara a mata, subia agora um monte de pedras ponteagudas, desci e subi, pisei uma erva verde como nunca vira, senti os sapatos molhados e dei por mim a gatinhar para alcançar o que me pareceu ser a entrada duma gruta.
Não era uma gruta. Pus-me de joelhos, agarrado a duas rochas ainhadas uma na outra, como dois peitos de mulher.
A luz do Sol entrava por entre a ramagem e iluminava aquele recanto com todas as cores do arco-iris. Pensei que havia chegado ao céu. A um metro de mim, um coelho olhava-me com olhos assustados e parara de beber, quando deu pela minha presença. Sem saber como nem porquê, senti-me rodeado pelo murmurar doce dum riacho, pelo chilrear dos pássaros no cimo das árvores, pelo pêlo luzidio do coelho, pelo macio da erva humedecida, pela luz que vinha do céu e me enchia a cara, as mãos, as pernas...
Por momentos, fiquei sem saber quem era eu: se o Sol, se o coelho, se aquele fiozinho de água que nascia daquela pedra brilhante...
13 Comentários:
Gostei Amaral...senti a frescura da serra e também fiquei sem saber quem era. Por momentos. Beijos.
um beijo para ti brilhante como a lua
Plagiei-te...sei que me desculparás. Beijos.
se o Sol, se o coelho, se aquele fiozinho de água que nascia daquela pedra brilhante...
Qualquer das opções seria linda!
Beijinho e Parabéns pelo texto refrescante!!
Cris
...fiozinho de água que, um dia, será mar.
Quem somos, afinal?
Um beijo, Amaral.
Amaral,
Começo por te dizer que arrancaste de mim uma gargalhada com a história dos "tomates", que não consigo parar de rir. Obrigada pelo momento Amigo.
Agora o teu texto. Brilhante como sempre!
Todos nós temos momentos em que nos esquecemos de quem somos. E sabes, estes momentos embora confusos, são o reflexo daquilo que na verdade não somos.
Beijo
Esqueci-me de quem era ao ler o teu texto.
Lindo...
bj
De vez em quando os momentos mágicos nos apanham... :) lindo...
beijinhos
sem saber quem era eu... :)
Que maravilha amaral, que entusiamo senti ao ler as tuas palavras.Até parecia que era eu que estava lá.Tudo isso nós somos, porque somos uno com a natureza e é sobre ela que vou escrever hoje.Já tinha pensado fazê-lo ontem, mas com a leitura do teu texto resolvi antecipar.
Que delícia foi ler este texto. Tato, olfato e visão foram por ele impressionados. Imagine então a imaginação!!!
Good day, my dear!!
Meu querido Amaral: Na verdade, assim passamos pela vida, sem saber quem somos. Em cada pedaco dela,somos alguem diferente,experimentando sensacoes. Os pes na agua, os olhos na montanha, a grama verdinha, o ceu azul, tanta coisa nos distrai e nos leva longe de nos mesmos.
Um beijo meu querido amigo. Voce eh um sol na montanha...
MARY
porque as coisas boas da vida não são acessíveis a todos os olhares...
Adorei trepar ao alto e quedei-me a sentir...
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