Lisboa,

domingo, setembro 25, 2011

vida em mim



É tempo de ler "Vida em Mim".
O livro foi-me oferecido pelo Marco e não podia deixar de lê-lo, ainda que nada conheça de Nuno Lobo Antunes.
Atraíram-me várias "passagens" e anoto aqui algumas delas. Por vários motivos, alguns com que concordo e outros de que discordo.

"Para mim, devia-se marcar um encontro entre o Génio da Lâmpada e a Pequena Sereia, porque nenhum deles tinha pernas, pelo que só se amariam da cintura para cima, numa mistura de corações e nada mais. Nessa altura (tal como agora, caro amigo), não sabia que se podia amar de outra maneira.
...
As mulheres, amigo, são cavalos que arrastam consigo, sem olhar para o lado, a imensa carga que a vida lhes coloca em cima, e a verdade é esta: dê-se um filho a uma mulher, e os homens passam a ser complemento. Claro que gostam de nós (com sorte até podemos ser amados durante parte do trajecto em comum), apreciam o que fazemos pela família, acham importante a complementaridade que oferecemos...
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Apetece-me muito mais falar do amor, da entrega, da paixão, do espanto perante um corpo lindo de mulher, e da minha exaltação dentro dele, e dos filhos que depois nascem, e riem, e brincam, e nos deixam na boca um sorriso, e nos olhos duas lágrimas de ternura que apenas espreitam do seu canto, num embevecimento que por inteiro se justifica. Que lindo dia, amigo! Que lindo dia!
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Que o próprio me perdoe, mas o Senhor nosso Deus, e a morte, seu lacaio, comportam-se da mesma maneira. Não me digam que não. É verdade, Deus é cobarde porque não se mostra para que possa ser julgado, e sem qualquer sentido de equidade, ordem ou razão, decide de forma arbitrária quem deve expulsar do jogo. Será porque quando lhe calhou a vez, alguém lavou dali as mãos, que ele faz o mesmo? Que ironia, que vingança mesquinha: a mim, feito homem inocente, tiraram a vida, ora agora tomem lá, que amor com amor se paga, que isso de oferecer a outra face já foi chão que deu uvas. Sempre lhe digo, amigo, Deus vê o cisco no olho do vizinho, mas esquece a trave que no próprio carrega. Se quem dá e torna a tirar ao Inferno vai parar, Deus e o Diabo jogam cartas a dinheiro no mesmo banco do jardim, e as moedas somos nós."

Esta última parte li-a sem qualquer dificuldade. Naturalmente que discordo por completo desta ideia absurda, mas compreendo que Lobo Antunes a explane nesta sua lista de recordações duma vida carregada de sinais que foram ficando nas memórias duma geração.
Lobo Antunes não entende o projecto divino. Analisa o quotidiano à luz da sua razão e dos reflexos emotivos que a sua vida profissional despoleta. Lobo Antunes explode emocionalmente porque, perante a profusão de casos que "caem" sobre ele, não vai além da constatação de injustiça que é a vida terrena. Os bons e os maus, os que tudo têm e os que morrem de fome, os que vendem saúde e os que nascem cheios de mazelas e doenças fatais, tudo isto, no mesmo instante, no mesmo local - sem um motivo, sem uma explicação, sem entendimento objectivo e subjectivo.
Para Lobo Antunes, o Criador tiraniza e "brinca" com os seres que criou. Escapa-se-lhe a "possibilidade" de Ele próprio (o Deus criador) estar "simplesmente" vivenciando e sendo "aquilo" que Ele é, na sua essência. Escapa-se-lhe a "possibilidade" de uma criança com um cancro ou um nascido "com defeito" estarem fisicamente neste mundo com um propósito sublime que a nenhuma mente humana esteja apta para entender...
Não fica mal a ninguém emitir a sua opinião ou a sua discordância ou a sua indignação perante o que "vê" à sua volta.
Também nada de mal irá acontecer a quem se enfureça com Deus e Lhe endereça os piores nomes e acusações.
Ele não ficará, de certeza, nada ofendido com isso!

1 Comentários:

At setembro 27, 2011 10:26 da manhã, Blogger BlueShell diz...

Concordo contigo:há "coisas" que não entendemos mas Ele tem um Propósito em tudo o que Faz.
Há momentos em que questiono, choro...mas no fundo sei...que algo me está reservado. E Creio...e tenho Fé...pois sei que Ele não abandona seus "servos".

Gostei da tua análise.
Fica bem.

...eu volto,
Deus querendo.

 

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